Software livre na educação artística

A Escola Secundária Artística de Soares dos Reis há já alguns anos que tem vindo a preferir soluções baseadas em software livre quer a nível do seu sistema de informação, gestão de rede e serviços, quer a nível pedagógico.

Neste artigo descrevemos a utilização de software livre na ESSR, começando com uma descrição acerca da Escola. Seguidamente descrevemos a utilização do software livre quer ao nível da infra-estrutura de TIC, quer na actividade lectiva dos diferentes cursos.


Introdução

O fenómeno do software livre está cada vez mais difundido, sendo o sector da Educação um dos que mais o tem adoptado e contribuído para a sua divulgação.

A Escola Secundária Artística de Soares dos Reis [1] há já alguns anos que tem vindo a preferir soluções baseadas em software livre quer a nível do seu sistema de informação, gestão de rede e serviços, quer a nível pedagógico [2].

Neste artigo descrevemos a utilização de software livre na ESSR, começando com uma descrição acerca da Escola. Seguidamente descrevemos a utilização do software livre quer ao nível da infra-estrutura de TIC, quer na actividade lectiva dos diferentes cursos.

Finalmente, apresentam-se os principais resultados da aplicação de um inquérito aos alunos do 10º ano na disciplina de Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) acerca da utilização de software livre na Escola.


A Escola Secundária Artística de Soares dos Reis

As origens desta Escola remontam ao ano de 1885 e, desde então, esteve sempre esteve ligada ao ensino artístico, em particular, ao das artes visuais. Actualmente, é uma Escola Especializada em Ensino Artístico, vocacionada para o ensino e a prática das artes visuais, oferecendo quatro cursos artísticos especializados:

  • Curso de Comunicação Audiovisual
  • Curso de Design de Comunicação
  • Curso de Design de Produto
  • Curso de Produção Artística

Estes quatro cursos, exclusivamente dirigidos para o nível de estudos secundários, decorrem em três anos – 10º,11º e 12º – e funcionam em regime de frequência diurna e nocturna. Estão orientados numa dupla perspectiva: o prosseguimentos de estudos em cursos de especialização tecnológica ou de ensino superior (universitário ou politécnico) e a inserção no mundo do trabalho.


Software livre

Resumidamente, o software livre caracteriza-se pela liberdade conferida ao utilizador de usar, distribuir, estudar, alterar ou melhorar um programa [3]. Na base da opção pela utilização de software livre esteve a consideração das várias vantagens inerentes à sua filosofia [4]. Essas vantagens podem ser agrupadas em:

  • pedagógicas
  • económicas
  • técnicas

Utilizando software livre é possível oferecer aos alunos os programas utilizados nas aulas para que possam instalar e utilizar em suas casas. Deste modo, garante-se que podem praticar em casa os conteúdos leccionados nas aulas. Evita-se também a cultura das cópias ilegais de software (vulgo, pirataria), contribuindo assim para uma maior consciência social e moral dos alunos. Para além disso, como o software livre é desenvolvido pela contribuição e partilha de conhecimento, estamos também a incutir e fomentar junto dos alunos estas atitudes. Finalmente, uma vez que o código é aberto, é possível aos alunos e professores estudar a forma como as ferramentas estão implementadas.

A vantagem económica mais evidente é a poupança em termos de licenciamento de software. Esta vantagem aplica-se não só às escolas mas também aos próprios alunos e encarregados de educação.

No que diz respeito a vantagens técnicas, salienta-se a fiabilidade e segurança do software livre e a sua maior imunidade a vírus, worms, etc. Um outro aspecto é o facto de, normalmente o software livre ser multi-plataforma o que permite que possa ser utilizado em diferentes sistemas operativos (e.g. Microsoft Windows, Apple Macintosh).


Utilização de software livre na ESSR

Serviços disponíveis para a comunidade

Utilizando dois servidores com o sistema operativo GNU/Linux (distribuição Debian) está disponível um conjunto de serviços para toda a comunidade escolar. Cada aluno, professor ou funcionário tem um código de utilizador e uma palavra-passe para acesso a estes serviços. Cada utilizador tem um perfil único em toda a rede o que permite que o utilizador tenha acesso à sua directoria pessoal a partir de qualquer posto de trabalho.

Para além disso, estão disponíveis os seguintes serviços:

  • correio electrónico (POP e IMAP) e webmail
  • acesso remoto à área pessoal via SSH
  • alojamento de página pessoais
  • acesso via Web ao Sistema de Informação Escolar
  • plataforma de gestão de aprendizagem Moodle


Sistema de Informação Escolar

A ESSR dispõe de um Sistema de Informação Escolar (SIE) desenvolvido sob a filosofia de Software Livre para apoio à sua actividade.

O SIE foi desenvolvido na Soares dos Reis, a partir de 2002, devido à inexistência no mercado de sistemas de tratamento da informação escolar em plataformas Cliente/Servidor, com a fiabilidade, versatilidade e a adequação necessárias à realidade da Escola.

Está assente numa plataforma cliente-servidor baseada no sistema de gestão de bases de dados PostgreSQL[5] e no servidor HTTP Apache[6] para acesso via Web. Existe também uma aplicação standalone disponível para os serviços administrativos e de gestão.

Sistema de Informação Escolar

Através da autenticação no portal da Escola é possível aceder a um conjunto de informações:

  • horários (sala, turmas e professores);
  • fichas pessoais dos alunos;
  • livro de ponto;
  • classificações e pautas;
  • informação relativa à Direcção de Turma (faltas, limites, etc);
  • gestor de eventos (visitas de estudo, testes, etc).

Sistema de Informação Escolar

Actualmente, graças a um protocolo com Departamento de Engenharia Informática do Instituto Superior de Engenharia do Porto (DEI-ISEP)[7], é utilizado em várias escolas secundárias do Grande Porto, e desenvolvido por um grupo de trabalho centrado no DEI-ISEP, bem como por algumas das escolas envolvidas no Projecto, que possuem know-how para tal.

Sistema de Informação Escolar


Actividade Lectiva

Disciplina de TIC

A disciplina de Tecnologias de Informação e Comunicação foi introduzida no ano lectivo de 2005/2006 no currículo do 9º e 10º ano de escolaridade, de forma a garantir que todos os alunos adquiram um conjunto de competências mínimas nas TIC.

No sentido de dar continuidade ao trabalho desenvolvido em torno do software livre na Escola, desde o ano lectivo de 2005/2006 que esta disciplina tem sido leccionada utilizando apenas software livre[8].

O programa da disciplina foi ajustado de forma a uma maior integração na área artística e com as restantes disciplinas. Assim as unidades leccionadas e respectivas ferramentas foram:

  • Folha de cálculo: OpenOffice.org Calc [9]
  • Tratamento de Imagem: GIMP (GNU Image Manipulation Program) [10]
  • Desenho Vectorial: Inkscape [11]
  • Criação de páginas Web: NVU [12]
  • Sistemas de Gestão de Bases de Dados: OpenOffice Base [13]

Sendo uma disciplina que pretende generalizar o acesso às TIC, a livre distribuição das ferramentas utilizadas nas aulas foi um factor chave na decisão da adopção destas ferramentas. Para além disso, estas ferramentas apresentam um nível de maturidade que permite cumprir todos os objectivos de cada unidade.

Disciplinas das áreas artísticas

Devido ao carácter profissionalizante dos cursos leccionados, algumas das disciplinas técnicas necessitam de software profissional e proprietário, pelo que existem 3 salas equipadas com este tipo de ferramentas, tais como, AutoDesk AutoCAD, Adobe InDesign, Photoshop, Flash, Dreamweaver, etc.

No entanto, existem algumas disciplina que não necessitam de software proprietário em todas a sua actividade. Este cursos tipicamente necessitam de ferramentas de edição de imagem, desenho vectorial, apresentações para a produção de portfólios, relatórios ou apresentações. Para estes casos, existem 3 salas equipadas exclusivamente com software livre (distribuição Ubuntu).

Como forma de divulgar e promover o software livre opta-se pela solução de dual-boot em máquinas que necessitem do sistema operativo Microsoft Windows. Instalam-se também as versões Windows do software livre mais utilizado (OpenOffice, GIMP, etc).

Estatistica de Sistemas Operativos

Terminais leves Linux

Recentemente a Escola recebeu um conjunto de computadores antigos. Com base na experiência da Escola Infante D. Henrique[14] com soluções de terminais leves Linux (Linux Terminal Server Project[15]) decidiu-se aproveitar esse equipamento, criando uma sala exclusivamente para os alunos realizarem os seus trabalhos. Para tal, utilizámos a distribuição Edubuntu [16] que disponibiliza uma versão de LTSP já pré-configurada.

A sala tem um servidor (um AMD Athon 64 bits com 2 Gb de RAM e duas placas de rede) e 13 clientes LTSP (desde Pentium II-400 Mhz até Pentium III).

Terminais leves


Principais dificuldades

Como anteriormente referido, a ESSR tem algumas necessidades específicas em algumas áreas como a Multimédia ou CAD. Nestas áreas ainda não é fácil encontrar software livre que cumpra todos os requisitos necessários. Por exemplo, para a edição de vídeo têm sido testadas várias ferramentas (c.f. Lives[17], Jashaka[18], Diva[19]) para as aulas de introdução a esta área no 10º ano. No entanto, ainda não foi possível encontrar uma ferramenta de instalação e configuração simples e com uma interface amigável.

Outra área onde temos algumas necessidades específicas é o desenvolvimento Web. Ainda não existe uma ferramenta WYSIWYG (What You See Is What You Get) com as mesmas funcionalidades do Macromedia Dreamweaver, por exemplo. Um projecto interessante é o NVU [20], mas foi descontinuado, existindo actualmente apenas o projecto Kompozer[21]. Uma ferramenta capaz de produzir aplicações em Flash é outra necessidade premente.


Feedback dos alunos

De forma a aferir a opinião dos alunos acerca da utilização de software livre na ESSR, optou-se por aplicar um inquérito on-line, utilizando o módulo Questionário [22] existente para a plataforma Moodle [23].

Este inquérito foi aplicado aos alunos do 10º ano na disciplina de TIC. Neste ano lectivo, o inquérito foi respondido por cerca de 170 alunos dos 220 inscritos na disciplina. Os resultados finais estão disponíveis para consulta [24]. Dos resultados destaca-se:

  • 60% dos alunos nunca tinham ouvido falar em software livre;
  • 74% instalaram software utilizado nas aulas;
  • 57% tencionam continuar a utilizar software livre (39% provavelmente);
  • 64% acham o software livre equivalente ao proprietário
  • 79% indicam como principal vantagem a possibilidade de o instalarem livremente;
  • a principal dificuldade é a língua/tradução;
  • 45% concordam totalmente e 50% concordam com a utilização de software livre nas Escolas.

Pode-se concluir que os alunos compreendem os princípios do software livre e que concordam com a sua utilização nas escolas. Instalaram as ferramentas nos seus computadores pessoais conscientes que tinham essa liberdade.


Conclusões

Da nossa experiência pensamos que o software livre é uma boa opção para as escolas. Os seus pressupostos adequam-se a um contexto educativo. Os alunos compreendem esses pressupostos e beneficiam da sua utilização.

Apesar de em certas áreas (c.f. CAD, Multimédia) ainda existir algum atraso relativamente a ferramentas proprietárias, a evolução rápida do sector do software livre, permite prever que rapidamente esta situação será ultrapassada. Em áreas mais genéricas, a maturidade deste software permite a sua utilização num grande número de áreas/disciplinas.


Referências

[1] Escola Secundária Artística de Soares dos Reis, http://www.essr.net

[2] A utilização de Software Livre na ESSR, http://www.essr.net/essr_gnu

[3] Free Software Foundation, Inc., The Free Software Definition, http://www.fsf.org/licensing/essays/free-sw.html

[4] Leal, Fernando J., Reflexão sucinta sobre a adopção de software livre na Escola, 2005, http://www.essr.net/portal/docs/software_livre_escola.pdf

[5] PostgreSQL, http://www.postgresql.org/

[6] The Apache Foundation, http://www.apache.org/

[7] Departamento de Informática do Instituto Superior de Engenharia da Universidade do Porto, http://www.dei.isep.ipp.pt/

[8] Martins, A. et al., Software livre na disciplina de Tecnologias da Informação e Comunicação, 2006, http://www.essr.net/~amartins/slivre

[9] Open Office Calc, http://www.openoffice.org/product/calc.html

[10] GIMP – The GNU Image Manipulation Program, http://www.gimp.org/

[11] Inkscape – Open Source Scalable Vector Graphics Editor, http://www.inkscape.org/

[12] NVU – Web Authoring System, http://www.nvu.com

[13] OpenOffice Base, http://www.openoffice.org/product/base.html

[14] Escola Secundária Infante D. Henrique, http://www.secinfanteh.net/

[15] Linux Terminal Server Project, http://www.ltsp.org

[16] Edubuntu, http://www.edubuntu.org

[17] Linux Video Editing System, http://lives.sourceforge.net

[18] Jahshaka Project, http://www.jahshaka.org

[19] Diva, http://www.diva-project.org

[20] NVU, http://www.nvu.com

[21] Kompozer, www.kompozer.net

[22] Módulo Questionário, http://moodle.org/mod/data/view.php?d=13&rid=84

[23] Moodle – Course Management System, http://moodle.org/

[24] Utilização de Software Livre na ESSR – Questionário (2007), http://www.essr.net/~amartins/essr_livre/questionario.html


Autores

Alexandre Martins: amartins@essr.net

Fernando Leal: fjleal@essr.net


Copyright

Copyright (c) 2007 Alexandre Martins and Fernando Leal.

É permitido copiar, distribuir e/ou modificar este documento de acordo com os termos da GNU Free Documentation License – versão 1.2 (http://www.gnu.org/copyleft/fdl.html) ou outra mais recente publicada pela Free Software Foundation.

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